quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

O Liberalismo Utópico

Por: Fábio Campelo Teixeira.


A expressão socialismo utópico surgiu para definir as teorias socialistas que, em tese, teriam um aspecto mais teórico, com pouca aplicabilidade no “mundo real”. Os defensores do liberalismo costumam usar pejorativamente a expressão como uma forma de classificar qualquer proposta socioeconômica mais social como sendo inexequível por definição. Me pergunto: não seria o liberalismo ainda mais utópico?
Por definição, o liberalismo defende que os agentes sociais, através da livre negociação, resolveriam os impasses surgidos durante as diferentes relações econômicas provenientes das imbricações típicas da vida em sociedade ou, nas palavras de John Locke, “Se cada um buscar o que é melhor para si, todas sociedade se beneficia”. Tal lógica apenas se torna aplicável se partirmos do princípio que, em uma situação de conflito, a parte econômica ou politicamente mais forte não se utilizará de sua posição de vantagem para pressionar a outra parte a se dobrar aos seus desejos. Dando um exemplo mais concreto, seria a mesma coisa que dizer que, em uma negociação salarial, o empregador não utilizaria seu poder econômico e seu capital político para forçar seus empregados a aceitar um aumento salarial menor.  Utopia!
Desde o final dos anos 90 do século XX, a economia estadunidense (e, por consequência, de todo o mundo “desenvolvido”) se baseou em uma politica de desestatização e desregulamentação radical de suas economias que atingiu seu auge durante os oito anos do governo George W Bush. Tal política se baseava na ideia de que, quanto maior fosse a rentabilidade das empresas, mais elas investiriam, gerando mais empregos e aquecendo a economia mundial através de um efeito cascata. Na prática o que aconteceu foi que quanto mais ricos os proprietários das grandes fortunas ficavam, menos se investia na produção e mais se aplicavam capitais no grande cassino que o mercado financeiro internacional havia se transformado graças as políticas de desregulamentação. Dinheiro passou a produzir dinheiro em um castelo de castas erguido sobre uma base fictícia sedimentada por balancetes fraudulentos, irresponsabilidade financeira e doses polifêmicas de arrogância, que arremessaram o mundo em uma profunda crise econômica.
Ora, mediante esse quadro qualquer pessoa racional repensaria a política de desregulamentação dos mercados e compreenderia a necessidade da existência de uma instância superior ao mercado para impedir os abusos de ordem econômica promovidos pelos senhores dos grandes capitais especulativos mas, apesar dos quatro anos crise provocados pela economia camicaze, o que fazem os adeptos do neoliberalismo? Continuam a combater as iniciativas de regulamentação da economia e continuam a propagar a falaciosa ideia de que é preciso mimosear os grandes empresários para que estes possam movimentar a economia ou, usando um jargão típico das políticas de Delfim Netto durante os anos de chumbo da ditadura, crescer o bolo antes de dividi-lo. O fanatismo liberal não cede aos fatos da realidade mesmo quando esta insiste em realçar a fragilidade da cantilena capitalista evidenciando as as falhas sistêmicas inerentes a uma sociedade que se define exclusivamente pela fome irrefreável em acumular bens materiais mas a verdade, por mais que os “intelectuais” do liberalismo tentem escamoteá-la com malabarismos epistemológicos, é que o liberalismo, tal como é concebido, é absolutamente inviável como alternativa para a construção de uma sociedade saudável e funcional.
Confrontados com a realidade dos fatos, os defensores liberais partem para duas linhas de ação diferentes: a primeira é naturalizar os ditames liberais vendendo a ideia de que, mesmo com seus defeitos, o liberalismo é a única forma de organização socioeconômica possível (desprezando o fato de que o liberalismo em si surgiu como alternativa a outros modelos já estabelecidos a sua época) e que tentar refutar seus princípios é futilidade e infantilismo. A segunda é agredir e desqualificar pura e simplesmente toda e qualquer alternativa que se que se apresente ao modelo liberal sendo que, nesse aspecto, eles se aproximam muito dos membros fanáticos de seitas fundamentalistas.
Mas, sobre isso, tratarei em outro artigo futuramente.

Fábio Campelo Teixeira  é Historiador.