sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

O Preço Social

Por: Fábio Campelo.

Em 2007, a cidade do Rio de Janeiro organizou os jogos pan-americanos mais caros da história. Embora as sucessivas auditorias que foram realizadas desde então, ainda não tenham sido capazes de determinar com certeza quanto do dinheiro público foi gasto na sangria, seguramente já é possível afirmar que o pan 2007 foi mais dispendioso do que os jogos olímpicos de Londres em 2012, por exemplo.
Para justificar a farra bilionária, o COB e as autoridades estaduais e municipais alegaram insistentemente que as obras eram caras pois estavam sendo construídas já atendendo as exigências do COI, preparando a cidade para receber os jogos olímpicos  futuramente, dotando-a de uma infra-estrutura esportiva completa, ou seja, gastou-se naquela época para economizar no futuro.

Recentemente, acompanhando as notícias sobre as olimpíadas de 2016 pela grande mídia, vi duas notícias que atraíram minha atenção: O velódromo construído para o pan será demolido e, em seu lugar, erguido um novo e o Parque Aquático Maria Lenk será usado, apenas, na competição de polo aquático, sendo que serão construídas ou adaptadas outras instalações para receber as demais modalidades de esportes aquáticos. Para justificar a mudança, o monarca do COB, Carlos Arthur Nuzman disse que as "fotos dos saltos ornamentais ficaram maravilhosas" no novo local.

Ora, somando o que se gastou para erguer o velódromo e o Maria Lenk chegamos a expressiva soma de cerca de 150 milhões de reais, verba que seria o suficiente para construir, equipar e manter por um ano 10 hospitais públicos com mais 60 leitos cada, acabando com desumano espetáculo das filas quilométricas nos postos de saúde ou com a vergonhosa espera de anos por atendimento em centros de referência.
150 milhões de reais é dinheiro suficiente para construir e mobiliar mais ou menos 25 escolas com dez salas de aula climatizadas, resolvendo assim os problemas de superlotação existente no estado onde, frequentemente, 50 crianças são espremidas em salas de aula com capacidade para metade disso.
150 milhões de Reais é dinheiro suficiente para iniciar e consolidar uma política ambulatorial e de amparo para recolher e tratar adequadamente dependentes químicos (os cracudos), resolvendo um grave problema social e médico, ao invés de se utilizar medidas truculentas e fascistas que além de não resolver, somente agravarão o problema a médio prazo.

150 milhões de reais trazem dignidade a muita gente mas, ao invés disso, eles foram simplesmente jogados no lixo. Por que? por causa de nossa infalível capacidade de escolher sempre o que existe de pior, de mais podre, de mais execrável na raça humana para conduzir a coisa pública, ou seja, os Nuzman, os Ricardos Teixeiras, os  Calheiros, os Sarneys, os Eduardos Paes e os Sérgios Cabrais da vida, Ratos imundos, ladrões, corruptos e incopetentes da pior espécie.

Fábio Campelo é historiador.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Agente não quer só comida


Os jornais de hoje noticiaram que o governo do estado e a prefeitura vão fechar 49 espaços culturais, em reação provocada pelo incêndio da boate Kiss. É obvio que, qualquer estabelecimento público tem que oferecer segurança a seus frequentadores e que aqueles que se encontram abaixo dos padrões exigidos devem sofrer as sanções previstas em lei, porém há alguns aspectos que devemos levar em conta ao analisar essa medida:
Desde 1998 tem sido prática constante dos governos carioca e fluminense a prática de acabar com os espaços públicos, principalmente aqueles destinados a atender as demandas das populações mais carentes. Ao longo dos últimos 15 anos foram fechadas escolas, hospitais, postos de saúde e parques e, aproveitando-se do ocorrido em Santa Maria, os "gestores" da coisa pública do Rio de Janeiro voltam sua sanha reducionista para os espaços culturais sendo que desses, não por acaso, os mais vitimados são exatamente as lonas culturais.
Quem conhece sabe que as lonas são importantes focos fomentadores de cultura nos subúrbios e comunidades carentes, promovendo shows de qualidade e uma série de atividades e cursos voltados para as populações de baixa renda da cidade. A interdição das mesmas acaba com os únicos espaços de lazer e cultura localizados fora das regiões centrais da cidade dificultando ainda mais o (pouco) acesso que as classes populares tem as manifestações artísticas e culturais. O governo afirma que a interdição será por apenas 20 dias, mas a história nos mostra que, findo esse prazo, os espaços localizados nas áreas nobres da cidade serão reabertos e os demais serão relegados ao mais completo abandono afinal a lógica meritocrática e venal dos nossos alcaides julgam desperdício de dinheiro investir em cultura para as camadas populares, visto que estas devem se manter em estado de brutalização e subserviência.
Outro aspecto que devemos ressaltar dessa medida é a forma de pensar irresponsável de nossos governantes. Até a queda dos prédios na Avenida Rio Branco (alguém ainda lembra disso?), não havia nenhum interesse em fiscalizar as obras e alterações realizadas nas construções da cidade; até a explosão do restaurante, ninguém se importava se haviam estoques clandestinos de gás de cozinha nesses lugares e, somente após o incêndio, vão se investigar os estabelecimentos com alvarás caçados desde 2010. Por que sempre é preciso que alguém morra para que as autoridades se movam? até quando o direito ao lucro dos poderosos vai se sobrepor ao direito a vida de todos?
Finalmente, encerro com o seguinte questionamento: Se ao invés de um boate de classe média alta, cheia de universitários, no Rio Grande do Sul o incêndio tivesse ocorrido em um Baile Funk no complexo do alemão, frequentado pelas camadas populares, a mídia faria a mesma cobertura do fato? a tragédia teria comovido o Brasil da mesma forma?

Fabio Campelo é historiador